Banzo
Projeto de exposição individual apresentado no 34º Programa de Exposições do Centro Cultural São Paulo em 2025.

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Banzo é um projeto de exposição individual selecionado pelo 34º Edital do Programa de Exposições do Centro Cultural São Paulo, e que busca construir um diálogo entre a sonoridade do Blues e Jazz e o Atlântico Negro1 enquanto espaço simbólico e geográfico das expressões artísticas que emergiram das diásporas africanas e das travessias transatlânticas. Originário do contexto afro-brasileiro, o “banzo” é um conceito que encapsula a melancolia e nostalgia intensas provenientes da dor da separação forçosa e da ausência da terra natal.

A partir de proposições instalativas e sonoras, a exposição apresenta as características, sonoridades, estruturas e temáticas do Jazz e do Blues como alegorias marítimas que se articulam através de elementos simbólicos recorrentes: a água, a corrente, e o azul.

Estes últimos não só evocam imagens fantasmagóricas — navios fantasmas, o mar, tumbeiros, corpos e aparições acorrentados —, mas aparecem também como matérias mediadoras da complexidade das identidades formadas na esteira do deslocamento forçado, bem como sobre a luta contínua por reconhecimento, resistência e celebração da ancestralidade através da música.

Dessa maneira, os trabalhos que compõem Banzo — Blue Notes (Notas Azuis) (2025), Blue Velvet (Veludo Azul) (2025) e Corrente (2024) — podem ser entendidos como manifestações espectrais não só de um passado colonial, mas de um passado livre, que se atualiza na contemporaneidade a partir de imaginários coletivos que assombram o presente, convocando uma ancestralidade que é ao mesmo tempo motivo de força e de dor.

A exposição não busca necessariamente se demorar na melancolia do Blues, estereótipo cunhado pela crítica musical branca, mas explorar a inventividade negra, onde sonoridades ancestrais e heranças musicais pré-existentes se reconfiguraram, transformaram e expandiram em meio à múltiplos contextos. Dessa forma, a palavra "banzo", aqui, não se reduz à tristeza, mas afirma a existência de algo que existia antes dela.

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1 O conceito de "Atlântico Negro", cunhado por Paul Gilroy, refere-se à circulação cultural e histórica entre a África e as Américas, marcada pela diáspora africana e pelos impactos da escravidão.




1. Blue Notes (Notas Azuis)
Piano Yamaha Disklavier, composição musical original e samples de blues, jazz e spirituals que utilizam blue notes
171 x 146 x 151cm
2025

Blue Notes (Notas Azuis) é uma instalação sonora na qual um piano de cauda com tecnologia autoplay toca uma composição musical original, bem como samples de músicas de blues, jazz e spirituals que utilizam blue notes. A composição autoral consiste num movimento de vai-e-vem entre diferentes tonalidades da escala blues, onde há uso do recurso da “blue note” — definida como uma nota musical de passagem, que é tocada ou cantada com uma ligeira alteração de afinação, geralmente para expressar emoções mais profundas ou melancólicas no Jazz e no Blues. A técnica consiste em produzir uma nota que não está presente na escala diatônica convencional, abaixando alguns semitons nos terceiro, quinto e sétimo graus dessa escala.

Embora a composição original tenha sido concebida para lembrar o movimento das ondas — variando em intensidade e velocidade —, outros samples musicais foram utilizados como uma homenagem a gêneros musicais que surgiram do blues ou que ajudaram a moldá-lo. Um desses exemplos é “Wade in the Water”, um spiritual tradicional afro-americano cujas letras possuem um duplo significado: uma mensagem codificada da Underground Railroad (ferrovia subterrânea) que orientava pessoas escravizadas a caminharem pelos rios para despistar cães farejadores, e também uma referência bíblica — evocando Deus abrindo o Mar Vermelho e o Rio Jordão — com os versos “God’s gonna trouble the water” [“Deus vai agitar as águas”], simbolizando a intervenção divina em tempos de sofrimento. Outros samples utilizados incluem: “Help Me” e “Keep It To Yourself”, de Sonny Boy Williamson; “Honky Tonk Blues”, de Jelly Roll Morton; “Boom Boom”, de John Lee Hooker; e “All Blues”, de Miles Davis, John Coltrane, Cannonball Adderley e Bill Evans.





2. Blue Velvet (Veludo Azul)
Cortina de veludo azul e trilho motorizado
2025

Blue Velvet (Veludo Azul) é uma instalação na qual uma cortina de veludo azul move-se horizontalmente pelo espaço expositivo — deslocando-se ora para a esquerda, ora para a direita — acompanhando a composição musical original executada pelo piano localizado no ambiente.

A cor e o movimento do tecido, com suas ondulações, evocam o fluxo das ondas do oceano, assim como a forma das ondas sonoras. Seu trajeto aparentemente aleatório alude à qualidade improvisatória da música Blues e do Jazz.

O título da obra faz referência à canção “Blue Velvet”, escrita por Bernie Wayne e Lee Morris em 1950. Desde então, a música — popularizada por Bobby Vinton em 1963 — foi interpretada por diversos artistas, incluindo uma versão do grupo de rhythm and blues The Clovers (1954). A canção também dá nome ao thriller psicológico dirigido por David Lynch em 1986. O uso de cores saturadas e imagens oníricas no filme complementa as sensações transmitidas pela música blues, em que som e letra evocam emoções melancólicas.






3. Corrente
Corrente de aço galvanizado, Arduino e motor de passo
Dimensões variáveis
2024

Corrente é uma instalação onde uma corrente de aço galvanizado, de um lado acoplada à um motor de passo controlado por Arduino e, de outro, atada à uma parede do espaço, se balança em intervalos de 1 minuto, emitindo um som.

O barulho e o movimento fazem referência às ondas sonoras e às ondas do mar – cenário do comércio de escravizados no atlântico e berço das diásporas que hoje conhecemos –, mas também às associações contemporâneas desse elemento: evidenciando estereótipos de representação de corpos negros e de fantasmas que vagueiam acorrentados em filmes e animações, ou reconfigurando-se na cultura do Hip-Hop e do Funk através da joalheria como tentativa de transformar uma imagem de aprisionamento em símbolo de liberdade e resistência.

O trabalho, dessa forma, conjura imagens fantasmagóricas e seu som e movimento contínuo evoca memórias associadas ao mar, ao assombro, à catividade e à emancipação.






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Registros: Estúdio em Obra